sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

1.
Cruzam os céus da Metrópole com as suas capas de destilados e fermentados, não querem salvar a Humanidade. Não querem ser salvos. Deus não existe, a inutilidade é uma inevitabilidade. A mesa de metal verde corroído de sessenta por sessenta é o seu casulo, onde se urdem planos de elevado grau etílico e se afagam as misérias.


“Estou cego! Não vejo!” – O Sol do fim de tarde cega-me, perfura-me as vistas. Mais um pouco e o gigante de pedra salvar-me-á da cegueira incandescente. Belo e doloroso é o brilho do Sol quase posto sobre um copo de imperial vazio. Mais uma! Nunca é só uma, nunca. Nem por uma única vez. A sina de um Homem-Esplanada é proteger a metrópole qual Cristo-Rei de carne e braços fechados.

É um camelo. É um Ratzinger. As coisas que se vêem nos pedaços de tinta solta do meu mapa-mundo verde enferrujado. Parecem pequenos choques de uma pilha de nove volts na língua os primeiros goles na imperial gelada que acaba de aterrar à minha beira. Um euro. Uma pequena fortuna, que nunca trocaria por uma litrosa morna e mais barata a dividir por doze “espécie-que-somos-bué-da-diferentes-e-alternativos-e-que-fazemos-ceninhas-com-bolas-e-fitas”. Alguns até com fogo. Excepto fazer algo de verdadeiramente impressionante como irromper em chamas. Um cão, dois cães, um arraçado de labrador, o outro rafeiro de camisa para fora, gravata lassa e litrosa na mão, um misto de jovem executivo sub-gerente de agência bancária de esquina com… Nada me resta no copo. Mais um euro. Nunca é sempre uma.

Adoradores do Sol espancam djambés freneticamente, como se o Sol nunca mais se voltasse a pôr. Pouco estranhos aromas povoam os ares. O Sol esconde-se por detrás do rendilhado dos casebres decrépitos da cidade, sendo substituído e pelo tom alaranjado dos candeeiros à antiga alimentados por lâmpadas economizadoras que fazem menos mal a um urso polar do que um flato de uma criança. O Sol desaparece por fim e a noite toma conta da ocorrência. O espancamento de djambés termina. Um certo alívio mistura-se com os aromas canabinóides que pairam sobre as nossas cabeças.
Dizem que a metrópole é uma bela cidade para se andar de bicicleta. Ímpios abstémios! Só mesmo quem nunca provou uma gota de álcool nas suas mais belas e múltiplas formas poderá afirmar tal barbaridade. O doce torpor das pernas, a visão enviesada, os ombros que acariciam as paredes. A Lua está cheia, o copo não.